quarta-feira, 5 de novembro de 2014
Não demorou. Foi tudo uma questão de poucos segundos, chuto a dizer que aconteceu em no máximo 30 segundos. Uma freada, um som de pneu cantando atrás, um vulto, a batida fofa, uma buzina e pessoas aglomerando formavam quase que uma platéia na calçada. Carros faziam fila e reduziam conforme o reflexo do motorista para também não bater.

Assim partiu um pai de família, talvez avô. O sol nem havia raiado direito, nesse horário de verão. O trânsito, para variar estava pesado, denunciando a falta de estrutura viária, fazia com que pedestres esperassem mais que cinco minutos por uma brecha entre os carros para atravessar a avenida. Motoristas, aqui, costumam não se importar com as sinalizações.

 De relance, motoqueiros tentavam espiar o acontecido enquanto costuravam a rua parada e o motorista de ônibus, desesperado, pedia aos passageiros para descer daquele enorme veículo pintado de laranja e branco. “não pode ser justo” com ele, afirmava. Parecia já sentir o peso e pesar dos familiares em suas costas, como a cruz de quem, por puro acidente, consequência do destino, acabara de colher uma vida (fruto proibido), sem a menor chance de escolha própria ou mesmo intenção de tal delito. Ao longe já se podia ouvir as sirenes.

O tempo parecia passar em câmera lenta. As luzes do semáforo apenas sinalizavam o óbvio, atenção. A maioria das testemunhas olhava para o corpo assustados, alguns mais fracos de aguentar desviavam o olhar, outros mais indiscretos faziam piadas. “Ele parecia ter pressa”, afirmou um logo atrás... Quem não tem pressa hoje em dia? O sol mal nasce e cada um de nós já está tentando ganhar a vida.

“Bom dia!” Pensei naquele senhor, agora jazido, sorrindo há exatos um minuto me cumprimentando, apenas pela educação. De súbito saiu da calçada atravessando a rua. Não deu tempo se quer de devolver a gentileza do cumprimento ou avisar sobre o ônibus. Primeiro a buzina, depois a freada e por fim o som fofo de pancada em carne, e lá estava ele estirado no chão, em plenos 60 anos. Suas últimas palavras: “bom dia!”

A sirene, finalmente encostou. Já havia dez minutos que eu olhava o ocorrido. Nunca pensei que um dia pudesse ver algo assim. A ambulância chegou, era tarde, agora era esperar a boa vontade do IML. As pessoas aos poucos iam retomando os rumos, aquele senhor havia perdido a vida. Eu perdi o dia in memoriam.

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