terça-feira, 11 de novembro de 2014
Não fazia muito tempo que tinha acabado de acordar. A fila da linha 021 parecia não ter fim, mas dessa vez o ônibus estava no horário. Fui um dos felizardos e ser um dos primeiros a entrar e conseguir acento, dessa vez.

– Sabe amiga, acho que vou procurar uma dessas clinicas de estética para colocar um silicone no meu bumbum – disse uma moça, morena, sentada num dos bancos reservados para idosos. Ela não parecia se importar.

 – Ai! Credo! Pra quê fazer isso, amiga? – retrucou a amiga. Ela tinha os cabelos tingidos em loiro platinado, que mais pareciam brancos que qualquer tonalidade de amarelo – Isso não é coisa de Deus não... Não ta vendo as notícias... Vai querer ser mais uma dessas meninas que foram naquela falsa biomédica?

De alguma forma aquela conversa me interessou. Não que eu seja bisbilhoteiro de conversas alheias, até tento fugir com meus fones, mas eu queria ver onde isso ia dar.

– Claro que vi, né... – falou a morena – Mas eu vou pesquisar um lugar bacana. Meu namorado disse que conhece um lugar com referência e tudo mais. Lá as esteticistas fizeram curso mesmo. Falo curso demorado.

– Ah é?! Quanto tempo? – perguntou a loira em tom de dúvida.

– Pelo menos um mês de curso, ué. Não é essa que fez o curso em cinco dias não – A morena tornou a falar, com certo ar de desdém pela pergunta da companheira – Você acha que não sei me cuidar é?

Terminou a fala e riu. Enquanto isso começava a foliar o jornal Daqui. Tive medo que ela ficasse com as mãos sujas de sangue.

– Mas para que você quer aplicar silicone no bumbum, amiga? – Deu-se por vencida, a loira, e partiu para as argumentações de que ela não precisava de nenhuma cirurgia – do jeito que você está, já ta bom. Não precisa de mais nada...

– Ai! Até parece né, amiga. Olha isso... – Virou-se um pouco de lado no banco vermelho do ônibus, e apalpou o bumbum. Não pude ver como – Eu quase não tenho nada e também quero ficar mais gostosa, né meu bem...

As duas riram um pouco.

– Sabe como é, precisamos nos cuidar – Continuou a morena – Se não, meu bem, quando tivermos lá pelos 40 anos estaremos um bagaço...

Fiquei pensando se academia não seria melhor do que qualquer intervenção cirúrgica, mas não sou pai da morena, não iria me intrometer.

– Ai! Mas nada que uma boa academia não resolva não é? – Ponderou a companheira loira.
– Que academia que nada. O Verão ta chegando... E academia só vai me deixar gostosa para o próximo, eu quero arrumar alguém legal é agora mesmo – Respondeu a loira – tipo um desses altos, com barba por fazer, esses assim não se interessam com mulheres que não tem bunda...

Elas riram mais um pouco. Mas de relance perceberam que eu a olhava. Não sou do tipo mais bonito, mas sou alto e tenho a barba por fazer. Se envergonharam um pouco. Meu ponto era o próximo. Comecei a sair do meu lugar, tinha que estar pronto para descer.

– Você diz tipo esse que acabou de se levantar? – A loira tentou cochichar. A morena meio que riu, encabulada – Você não precisa disso não, quer ver?

Nessa última frase, a loira parecia querer provar seu ponto de vista. Olhou para mim.

– Moço, fala a verdade. Você não acha que ela está bem assim? Você acha que ela precisa de silicone no bumbum? – Perguntou para mim, a loira.

Tentei me esquivar da conversa. O ônibus parou no sinaleiro. Maldita hora que eu estava prestando a atenção na conversa alheia.

– Ele não quer responder porque, como homem, sabe que a maioria gosta de mulher gostosa, Carla – Disse a morena, entrando na jogada da loira. Alguns no ônibus me olhavam.

– Não moças! Homem de verdade gosta de inteligência, apenas moleques que nunca encontraram a beleza de uma mente pensante é que prefere suas bundas... – Respondi, rindo.

Desci do ônibus, finalmente. Elas continuaram o trajeto, não sem antes de me olhar com uma expressão de “eu ein... Deve ser doente.” Dormi a tarde inteira.

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