quarta-feira, 22 de outubro de 2014
A tarde já estava chegando próximo ao fim, quando resolvi por
bem cumprir um dos meus antigos rituais. Tomar café. Só Deus e minha falecida
avó sabe o quanto gosto dessa bebida, mas com o calor que anda fazendo
ultimamente é até perigoso arriscar tomar quente. Sendo assim, chegando no Café
da Tia Nair, resolvi pedir um café gelado e 4 pães de queijo. Não tinha o
biscoito frito. O local até que estava vazio para o
horário, o que não é de estranhar pela temperatura.
–
Café gelado... Hmmm coisa de viadinho ein... – disse um conhecido de frequentar
o local, que eu se quer havia notado a presença.
– Sabe como é... Com esse calor, jogar café quente na pessoa é pedir pra morrer – respondi sem querer ser mal educado, afinal da última, primeira e única vez que o vi até parecia ser mais inteligente do que essa memória coletiva brasileira de ser machista, a ponto de não poder nem ver um cara pedir um café gelado sem perceber que isso não é uma questão sexual.
Sorri
meio que sem graça para ele tentando sair de perto. Afinal, uma coisa que venho tentando entender é a afirmação
de que se você não faz isso ou faz aquilo é gay. Por exemplo, se eu me visto
bem, se eu resolvo tomar suco ao invés de cerveja, ou se por ventura prefiro
picolé a sorvete de copo, sempre vai ter um amigo ou mesmo desconhecido
afirmando que “isso é coisa de gay (com variações para bichinha e viado)”. Mas
então, o que diabo é coisa de “hétero”? E se por ventura eu gostar de ‘coisas
de gay’, qual é o maldito problema?
–
E bicha ‘lá’ morre? No máximo com esse calor, derrete e vira brilho labial, meu
bem... – insistiu no assunto, agora com uma voz estereotipada.
Novamente
dei um riso forçado, tentando, ainda, não ser mal educado e mudei de assunto. Já
que tão insistentemente ele queria falar comigo. Parecia estar carente, largado
naquele balcão de um café, tomando suco de limão e comendo bolo de chocolate
sozinho, sem nem o balconista para dar atenção. Mas não permaneci por muito tempo,
a conversa não estava lá muito agradável e meu café e dinheiro já estava
completamente no fim.
O
final de tarde ainda continuava, apesar de já ter passado das 18 horas, coisa que
acho muito bom no horário de verão – sim, gosto desse horário e espero que não
seja coisa que de gay também. Decidi que, já que o sol ainda estava no
horizonte, iria caminhando para minha casa. Pois uma tarde prometendo chuva
de um lado e céu aberto do outro, temos que no mínimo aproveitar.
Pelo
trajeto, passei por algumas lojas de roupas. Na vitrine estava uma camisa pólo
branca e uma outra salmão. Ao menos era o que dizia na identificação, para mim
era rosa. Entrei para dar uma olhada no tecido. E quem veio me atender? Um
amigo que há muito não via, até quase supus que deveria ter voltado para sua
cidade natal em São Paulo.
–
E aí, rapaz... A quantas anda? – perguntei abraçando-o.
–
Lúcio! Caramba! Quanto tempo? – me cumprimentou – cara tu deu uma engordada
massa ein...
Soltou
aquela gargalhada na loja e alguns clientes passavam sem entender muito bem. Conversamos
um pouco, expliquei que na verdade eu já estava era em processo de emagrecimento. Mas ele estava com pressa de atender, até porque estava no trabalho.
–
Eu queria dar uma olhada nessa camisa – apontei a camisa pólo branca. O desenho
havia me chamado mais atenção, devido ser três botões ao invés de dois.
–
Camisa pólo? Que coisa mais gay! – Disse rindo – Não prefere a rosinha não...?
Ri
para ele com minha velha mania de levantar a sobrancelha, mas dessa vez sem
nenhuma resposta sarcástica.
–
Não é rosa é salmão. Tá escrito aí. – Respondi em tom de brincadeira – Mas não quero a branca mesmo.
A
camisa tinha uma falha na costura interna, que ele mesmo notou. Acabei por não
levar nada.
–
O que vai fazer agora, man? – Me perguntou.
–
Ah! Vou para casa, quem sabe fazer algo pra comer ou jogar WoW (World of
Warcraft) – Respondi despedindo.
–
Porra, você não cansa de ser viadinho...? Para com essa vida rapaz! – Me
respondeu rindo.
–
Sabe como é... Uma vez gay, sempre gay... – respondi rindo e me conformando em
ser gay por ações. Afinal nesses casos é melhor assumir logo, do que ser gay no
armário. Mesmo eu sendo hétero. Não iria afetar minha masculinidade mesmo...
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